Execício de Imaginação Osman Lins
O pássaro, a menina, a bola e o gato. O gato, a bola, a menina e o pássaro. O pássaro a bola o gato a menina. A menila o pasto a bona e o gásaro. A Pastomenila e o Bonagásaro.
Encontraram-se um dia, numa encruzilhada, a Pastomenila e o Bonagásaro. A Pastomenila: corpo de penas, asas de palheta, rabo curto de seda e longos dentes de vidro; o Bonagásaro talvez fosse feito de esponja (diminuía de volume, quando o apertavam), falava aos berros através do bico muito comprido e rubro, andava sem que ninguém lhe ouvisse as pisadas, e saltava para o alto, com facilidade, acionado por molas, quando contrariado.
A Pastomenila abriu as asas; o Bonagásaro pôs-se a andar em silêncio. Soprou entre eles um vento brando e morno.
- O verão está chegando - berrou o Bonagásaro.
- O inverno também - disse a Pastomenila, falando devagar, para que as palavras fizessem tilintar os cristais dos lustres de cristal.
- Ontem chegaram os peixes - foi o brado seguinte.
Fazendo ressoar melodiosamente os incisivos, a Pastomenila informou:
- E amanhã, às 10 horas, no máximo, chegam as aves.
- O Pavão também?
- Não.
O Bonagásaro mastigou a palavra “não”, engoliu-a e começou a saltar extremamente irritado. “Por que o Pavão não vem? Por que não vem o Pavão? O Pavão não vem por quê?” Seu bico vermelho parecia uma espada, enquanto ele explorava as possibilidades sintáticas da frase. Quando silenciou, disse a Pastomenila:
- O Pavão chega hoje com os leões.
O Bonagásaro bradou: - Por quê? Quem deu ordem?
A Pastomenila começou a girar, tilintando a cristalina dentadura. Abriu de súbito as asas de palheta e enlaçou chorando o Bonagásaro, que ficou menor.
Nisto, o vento, antes suave, entrou a soprar forte. Receando serem arrebatados, o Bonagásaro e a Pastomenila uniram-se com desespero.
- Também está chegando o Outono - gritou ainda o pobre Bonagásaro.
- Também a Primavera - tilintou a outra.
Regiraram os dois, ouviu-se em meio àquele torvelinho, com um rumor de taça quebrada contra as pedras, a palavra ARPRIMEVA! Cessado o vento, eram outra vez, na página, o gato, a menina, a bola e o pássaro.
Não havia sinal de Pastomenila nem de Bonagásaro. Cerrei os dentes e ergui a cabeça, à espera do Pavão, com sua imponente guarda de leões